A mesma forma social
Data:09/11/2017 - Hora:08h39
Gilberto Freyre, sociólogo, conta que, embora já tivesse a ideia de um livro sobre a formação brasileira, foi durante a sua passagem pela África, a caminho do exílio na Europa, em 1930, que a ideia ficou nítida. A obra começou a ser escrita durante a época em que, na qualidade de professor-visitante da Universidade de Stanford, mas, no Recife, Casa Grande & Senzala foi concluído. “Um livro que responde àquela ânsia de se descobrir como brasileiro, de descobrir um Brasil que ninguém ainda tinha me explicado satisfatoriamente. Faltava-me uma explicação em profundidade do Brasil. Este livro representa um homem a se autobiografar através do seu próprio povo: pessoal e coletivamente.” Casa Grande & Senzala não interpreta apenas o Nordeste, mas todo o Brasil, quando diz que a casa-grande do Nordeste açucareiro, “símbolo da primeira sociedade estável do Brasil, transferiu-se depois para outras regiões, para outras culturas regionais e econômicas. Mas a forma social será sempre a mesma. Toda civilização do café, tão importante foi uma transferência da casa-grande do Nordeste açucareiro para o Brasil cafeeiro, que não é só paulista, mas fluminense e, também, paranaense. O fenômeno se repete ainda no Brasil quanto à estância, porque há uma casa-grande patriarcal também na fazenda de gado”. Em torno de sua ideia básica desenvolveram-se todos os que se seguiram, na linha de interpretação sociológica da formação da sociedade brasileira. Considero a mucama, por exemplo, o primeiro grande tipo de mulher produzida pela civilização brasileira, ao lado da sinhazinha – mucama, porque era um tipo de brasileira bonita e sobrecarregada de jóias, pois era por meio dela que o senhor da casa-grande ostentava a sua riqueza. A mucama era mais fácil de ser exposta que a sinhazinha, mais resguardada.” Ora, esse tipo de mulher adornada, que era africana ou semiafricana, é um produto de senzala aristocratizada pelo livro. De modo que essas duas influências estiveram sempre presentes. São modelos para o Brasil, clássicos, de dois tipos de beleza de mulher a se completarem. O que não posso é satisfazer aos meus críticos, deixando de reconhecer a importância da casa-grande, para dizer demagogicamente: que pena a senzala não ter sido maior que a casa-grande. Não podia ter sido. A civilização que o Brasil desenvolveu é predominantemente européia, embora felizmente não o seja de forma exclusiva. A grande glória da nação é ter dado ao negro vindo da senzala a possibilidade de se exprimir. Como se exprime, por vezes, aristocraticamente e africanizando, a
cultura brasileira nas suas formas básicas.
Em Casa Grande & Senzala as duas palavras convivem lado a lado, compondo uma Nação conflitante em seus jogos de interesse, recalcado e integrado. Feixe de paradoxos que se mistura, abastarda, enriquece e relata o processo de evolução social do Brasil, que recria as imagens de um passado marcado pela colonização portuguesa. Uma união marcada pelo conflito e pelo desequilíbrio. Uma história da realidade do País, que pretende analisar a formação patriarcal, principalmente no Norte e Nordeste, e mostrar como se processaram as relações entre os brancos e as chamadas “raças de cor”. ***___Rubens Shirassu Júnior, escritor, poeta e pedagogo, de Presidente Prudente, São Paulo. Autor, entre outros, de Religar às Origens (1980-2010, ensaios e artigos, 2011)
fonte: Rubens Shirassu Júnior
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