O bem e o mal
Data:17/05/2017 - Hora:07h59
O bem e o mal são simplesmente palavras que correspondem a níveis de compreensão do universo observável. A vivência ética na nossa sociedade imediatista tende a ser preguiçosa e socialmente indiferente, fazendo com que se tome como modelo do bem, simplesmente, os costumes sociais correntes.
Tudo piora quando tal vivência se torna espiritualmente indolente e moralmente estática, quando se assume como modelo do bem as práticas e tradições religiosas. Mas, a bondade, e até mesmo a verdade, é sempre relativa e sua percepção é o que permite ao ser humano efetuar as decisões pessoais que caracterizam uma vivencia ética ou não.
Uma experiência é boa quando eleva a apreciação da beleza, a vontade moral, o discernimento da verdade, a capacidade de amar e servir aos semelhantes. Assim, há um aumento dos ideais espirituais e capacidade de experimentar a bondade e discernir a verdade.
Já a capacidade de se manter no erro e experimentar o mal somente será superada pela longo ascensão da alma humana até os níveis espirituais mais altos.
A bondade é vivente, relativa, sempre em progresso, é invariavelmente uma experiência pessoal e correlacionada com o discernimento da verdade e da beleza. A bondade se encontra no reconhecimento dos valores positivos que superam a miséria da vida humana.
Mas a possibilidade do mal é necessária para a eleição moral, não sua realidade. O mal potencial funciona como o bem como estimulo para tomar decisões de progresso moral, sendo que o mal somente se torna uma experiencia pessoal quando a mente moral o escolhe deliberadamente.
Como exemplo concreto dessa situação temos a superação de uma das mais degradantes formas de relação humana que já houve, a escravidão, no exemplo americano. Inicialmente, Abraham Lincoln não intencionava que a sangrenta Guerra Civil fosse uma luta pela libertação dos escravos, mas somente proibindo-a nos novos Estados, tendo lançado a Proclamação de Emancipação somente quando a posição da União ficou desesperadora.
Foi a guerra mais letal dos tempos modernos antes da primeira guerra mundial, com 620 mil soldados mortos, quase o mesmo número de americanos mortos na soma de todas as demais guerras que se envolveram.
Mas, porque a escravidão era uma força tão poderosa nos Estados do sul, a ponto de envolver tanta gente que se sentia honrada, religiosa e decente por morrer e matar na defesa dessa “instituição peculiar”? Não era interesse direto, pois dos 8 milhões de brancos que viviam nos estados escravagistas somente 383 mil possuíam escravos, dos quais metade tinha menos que cinco.
Apenas três mil dos tais 8 milhões correspondiam à imagem de fidalgos donos de “plantations”, com mais de 100 escravos, plantando tabaco, açúcar, arroz e algodão de forma eficiente. Sua riqueza dependia de expansão em novos estados comprados da França ou conquistados da Espanha, o que era mal visto pelos estados do norte, com economia calçada em pequenos agricultores e industrialização incipiente.
O sul escravagista era muito mais rico, inclusive mais rico que qualquer pais europeu, com exceção da Grã-Bretanha. E esteve várias vezes próximo à vitória, alcançada pelo norte pela firme liderança de Lincoln, melhores generais, violenta repressão a motins e, principalmente, a força bruta representada por uma população maior e mais industrias. O sul sofreu com a morte de um quarto de sua população masculina, soldados que não lutavam pela escravidão, porque escravos não tinham, mas sim por lealdade à terra, à família e tradições locais, além do medo, justificável, das péssimas condições de vida reservado aos trabalhadores nas fábricas no início da revolução industrial.
O fim da Guerra Civil e a abolição da escravidão não significou melhores condições de vida para os escravos, que muitas vezes passaram a viver sob mais miséria e opressão do que antes, nem para os nativos americanos, vítimas do projeto expansionista dos Estados Unidos fortalecido pela homogeneização política e econômica que se seguiu.
Mas, exemplifica bem como o ser humano individualmente ou nas suas várias coletividades só tem valor na medida em que aumentem o bem estar, a felicidade e o progresso dos indivíduos e do conjunto planetário.
Sandra Cristina Alves é defensora pública do Estado, escritora e escreve exclusivamente neste Blog toda segunda (sandrac.alves@terra.com.br)
fonte: Sandra Cristina Alves
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